Capitulo 01

Parte da série Essas Coisas Que Eu Mal Sei

Meu nome é Christopher, mas todos me chamam de Chris, hoje estou com 32 anos, sou advogado formado e nos dias atuais conquistei meu próprio escritório. Pra contar a história, preciso voltar ao tempo mais precisamente para o ano de 1989. Esse ano mudou a minha vida. Morávamos, meus pais e eu em um belo apartamento em uma cidade no interior do Rio Grande do Sul. Meu pai era médico, bem sucedido e minha mãe dona de casa. Sempre zeladora do bem star da família. Era uma criança extremamente feliz. Não tinha problemas, apesar de sempre me sentir "diferente" das outras crianças da minha idade. Com tudo, meus pais sempre souberam lidar bem com essa minha diferença. Nunca me repreenderam e sempre conversaram abertamente comigo. Não era uma criança afeminada, mas sim muito tímido, franzino, delicado.

Meu pai, Dr. Alberto era homem muito bem visto na cidade e na alta sociedade, sempre recebiam convites para festas, jantares e minha mãe adorava aquele mundo. Eu também adorava vê-la vestida naqueles lindos vestidos, usando sempre jóias alinhadas... Dona Vera mais parecia uma lady, uma rainha.

Naquela noite fria de junho eu já estava no quarto me preparando para dormir, quando mamãe foi até mim se despedir. Sentou-se na beira da cama, arrumou os cobertores, ajeitou o travesseiro e por fim me deu um beijo em minha testa. Mal sabia eu que seria a última vez que a veria viva. Naquela noite senti um perfume diferente, e até perguntei se ela havia comprando uma colônia nova. Ela apenas sorriu, depois falou:

- Quero que seja um bom guri. Obedeça a tia Rebeca. Eu sempre estarei contigo.

E assim ela se foi e nunca mais voltou. Naquela noite, depois do jantar, meus pais estavam voltando para casa quando um acidente aconteceu. O carro capotou e explodiu minutos depois. Os peritos naquela época apontaram falha no motor do carro, mas nada foi provado. Fiquei sozinho aos dez anos de idade. Não sei descrever como foram aqueles dias após o acidente, por que ainda hoje não sei o que senti de verdade. Chorei muito no colo de Rebeca, que era a moça que trabalhava como minha babá. Os funerais mobilizaram a cidade e região, Meu pai era muito querido por todos, inclusive pela população carente, onde mantinha uma instituição de caridade.

Uma semana depois recebi em casa tia Suzana. A irmã mais nova do meu pai, que morava na Itália, na época. Era a única pessoa da família que estava viva, e que por fim, ficou com a minha tutela. No auge dos seus 25 anos, Suzana nunca deixou que eu a chamasse de tia, sempre por Su, como era seu apelido. Como sempre viveu em Milão, Su não se habituou a minha pequena cidade. Perguntou se eu me importaria se nos mudássemos para Porto Alegre. Como eu estava muito triste naquele apartamento, pois tudo me lembrava os meus pais, não fiz objeção de me mudar, a não ser de levar Rebeca, que a cada dia se tornava essencial em minha vida. E quase um ano depois da morte dos meus pais, nos mudamos para Porto Alegre.

Fui matriculado na melhor escola e assim seguia a minha vida. Fiquei muito amigo dos irmãos gêmeos Estela e Estevão, que tinham a mesma idade que eu, morava no mesmo condomínio e por fim estudavam na mesma escola. Su quase nunca estava conosco. Vivia mais na Itália do que no Brasil, isso porque tinha plena confiança em Rebeca, que sempre cuidou muito bem de mim. Augusto, vulgo tio Guto era o responsável pelo meu transporte escolar, e naquele dia-dia, Rebeca e Guto acabaram se apaixonado. Eu já tinha 13 anos na época e incentivava os dois a se entregarem aquele amor. Rebeca levava na brincadeira, dizia que só poderia assumir sua vida o dia que eu assumisse a minha, ou seja, quando fosse maior de idade e responsável por mim. Sentia-me mau com aquilo, pois não queria prejudicá-la. Queria vê-la feliz, pois eu a amava como minha mãe.

Estela se tornou muito especial em minha vida. Todos diziam que íamos acabar nos casado quando crescêssemos. Mas nossa amizade era muito mais que amor carnal. Era algo de outra vida. Nos entediamos pelo o olhar. Certa vez, como era de costume, fui tomar café na casa dela antes de irmos para a escola. Sentei do lado de Estevão e Estela estava na outra ponta da mesa. Eu peguei o jornal e propus uma brincadeira com ambos. Eu abriria o jornal em uma página aleatória, e eles teriam que adivinhar qual era a página. Estevão errou todas, e por incrível que possa parecer, Estela acertava sempre. Tia Eliane, mãe dos gêmeos, achou interessante, e como era psicóloga, foi pesquisar sobre o assunto, e depois de um tempo nos disse que Estela e eu vibrávamos na mesma sintonia... era a explicação que ela havia achado por aquele curioso fato.

Tanta cumplicidade uniu Estela e eu, que acabei contando e dividindo minhas angustias. Contei a ela que gostava de meninos e não de meninas. Nem lembro como foi isso, mas contei! De primeiro isso ficou apenas entre nós. Mas depois começaram a surgir dúvidas que ela, assim como eu não tinha a resposta. Ela sempre perguntava pra tia Eliane, que de boba não tinha nada, sabia que o amigo cheio de dúvidas era eu. Com o tempo, acabei dividindo com ela também o meu segredo. Tia Eliane foi sensacional comigo, me levou em palestra, me aconselhou terapias, e me fez entender que o que acontecia comigo era normal, e que existiam muitas pessoas na mesma situação.

Quando terminei o ensino médio, Su me matriculou em cursos em Milão. De primeiro bati o pé e disse que não iria, mas com o tempo, tia Eliane e Estela me fizeram entender que seria bom para meu futuro conhecer outro país e ter essa experiência. Foi então que, durante três anos da minha vida, praticamente morei em Milão. Vinha periodicamente ao Brasil ver Rebeca e meus queridos amigos. Estevão já estava namorando Miriam, pensando em se casar quando acabasse a faculdade de medicina. Estela estava cursando psicologia, para a felicidade tia Eliane, que sempre quis ver um dos filhos seguir sua profissão. Rebeca e Guto, finalmente haviam engatado um namoro, o que me deixava por demais feliz. Cada despedia doía o peito. Era horrível pra mim me separar deles. Mas tinha que terminar os cursos que me propus a fazer.

No ultimo ano, 1999, fiquei direto em Milão, sem vir ao Brasil. Su havia aberto uma confecção lá e pediu a minha ajuda para tocar o negocio. Conversava com Estela por e-mail e cartas e ela me contava as novidades... que estava namorando um rapaz chamado Marcus, que ele era lindo e o amor da vida dela. Demonstrava-se completamente apaixonada por ele, e eu estava feliz em saber que minha grande amiga estava amando, mas um pingo de ciúmes despontou em meu peito.

No fim daquele ano decidi voltar definitivamente para o Brasil. Estava na hora de fazer uma faculdade e de assumir a minha vida, pois já estava com 21 anos de idade. Avisei apenas Estela que estava chegando, pois queria fazer surpresa a Rebeca, e ela prometeu me buscar no aeroporto e assim o fez.

Era inicio de dezembro, cheguei pela manhã, o aeroporto estava enfeitado com decorações natalinas, quando desembarquei, logo vi Estela e com o carrinho de bagagem corri para abraçá-la. Um abraço gostoso, cheio de saudades. Seus cabelos loiros, encaracolados, tinha o mesmo cheiro da infância que nos marcou. Entre o abraço, meus olhos cruzaram com os olhos daquele rapaz de pele branca e os cabelos negros, de óculos de grau e com um sorriso tímido. Foi amor à primeira vista, o que eu senti.

Estela depois de alguns segundos me soltou, me segurou pela mão e nos apresentou:

- Chris, esse é Marcus, meu namorado!

Comentários

Há 1 comentários.

Por Angellix em 2013-11-23 01:47:32
Esse conto promete hen...